segunda-feira, 1 de junho de 2009

Gesto II



II
Dizem que durante a guerra uma jovem alemã, que falava unicamente o alemão, estava com um italiano que também falava somente sua língua de origem ,em uma casa em ruínas dividindo uma única cama e coberta ;era inverno e fazia muito frio e a jovem expressou-se em sua língua:” kalt...kalt ,sehr,sehr kalt!” a qual o italiano interpretou...se per te fà caldo, per me fà freddo(se para ti faz calor, para mim faz frio) ,e puxou todas as cobertas para si ,deixando a companheira encalorada , (ele entendeu kalt, frio em alemão, como caldo,calor em italiano)fora das cobertas . Se ao invés de ter manifestado seu frio com uma expressão oral em uma língua desconhecido do seu interlocutor, ela tivesse expressado com gestos e tiritar de dentes, lábios, etc, tivesse feito seu companheiro entender ... !
Existe um conto popular em que um homem” oferecia um fabuloso prêmio a quem o vencesse numa disputa por gestos. Entre os diversos desafiantes experientes e estudados que concorreram, encontrava-se um camponês, que fora convencido por alguns estudantes a participar da contenda, fizeram-lhe crer que teria a chance de ficar rico com o prêmio. Ele, o camponês, se dispôs então a enfrentá-lo. O douto opositor mostrou-lhe um dedo ao qual o desafiante mostrou-lhe os dois. O sábio estendeu três dedos e o camponês fechou a mão, como para lhe esmurrar.O desafiado mostrou-lhe uma maçã para o qual o desafiante exibiu um pedaço de pão. E o douto desafiado declarou seu opositor vencedor e este recebeu o prêmio que lhe cabia por vencer a disputa .Os estudantes se aproximaram do camponês vencedor e lhe pediram para que lhes explicasse os sentidos dos gestos da disputa. Bem, ele disse: o meu opositor ameaçou de furar-me um olho e eu lhe revidei que furaria os seus dois olhos. Ele ameaçou de arranhar-me o rosto com os seus três dedos ;não me intimidei e o ameacei de esmurra-lhe com minha mão cerrada. Ele para deixar-me calmo, pois viu que eu não o temia , ofereceu-me uma maçã; e eu lhe mostrei não ter fome pois ainda tinha pão. Por isso o venci.
 Aos seus amigos, o doctiloqüente perdedor explicava a simbologia usada pelo vencedor e o teor da disputa:. Com um dedo ele quis dizer que deus é uno ao que o camponês retrucou mostrando-me os dois dedos lembrando-me do Deus-Homem. Quando lhe mostrei os três dedos evocando que eram três pessoas distintas ele mostrou-me a mão fechada significando que estão reunidos os três num único Deus . Exibi-lhe uma maçã significando que perdera-se o paraíso por uma fruta ao que ele contestou, mostrando-me o pão significando que o paraíso fora reconquistado por Jesus Cristo transubstanciado no pão que alimenta o espírito.

Tal exercício de mímica não se deve a mero exercício adivinhatório mas uma contenda entre opositores de níveis de inteligência desiguais onde cada gesto ,cada sinal,cada mímica assume a significação lógica do seu próprio entendimento interpretativo e perceptivo do mundo em sua volta e de onde ainda podemos extrair e compreender que a palavra assume novos significados ,ela evolui... o gesto não ,ele é indelével; o gesto é altivo, sublime representa a si próprio despido de qualquer presunção em qualquer cerimonial, por ser único, insubstituível e sem sinonímia. Ele é em si a essência da universalidade do homem sem fronteiras nem etnias, apenas comunicação, pura, sem mácula, sem ironia.Não se é hipócrita com gesto e sim com palavras ;pois a palavra como a compreendemos não passa de mero exercício de retórica explicativa sendo as vezes intraduzível ou de difícil significado, enquanto o gesto é como a energia pura em seu estado latente. É autêntico e exprime por si só a plenitude do inexprimível; traz na sua essência, a inteligibilidade inata das quais os loquazes são incapazes compreender mesmo com a disponibilidade de todas palavras ao seu alcance !
JATeixeira

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